Le Entrevista a João Ferreira por Pedro Alfacinha


O Queer Lisboa vai já na 16ª edição, qual o balanço que é possível fazer?

Olhando para estes 16 anos o festival cresceu, mudou muito. Quando apareceu erao único festival de cinema a acontecer em Lisboa. Estávamos em 1997 e houve uma necessidade de mostrar muitos filmes que tinham sido realizados até aquele ano. As primeiras edições ficaram um pouco marcadas por isso. Nos primeiros anos entrou muito cinema independente como o François Ozon e mesmo os filmes do Almodóvar.

Com a vinda do DOC para Lisboa e com o aparecimento do Indie isso acabou também por transformar um pouco o festival. Teve que se repensar toda a programação porque os filmes acabavam por ficar distribuídos por esses festivais.



De que forma é que um espaço físico como o Espaço Queer Lisboa na Pensão Amorfazia falta?


Fazia falta porque permite pensar a programação, discutir diariamente, de umaforma orgânica, natural, não era algo imposto com horários como acontecia antes. A programação e a produção deste festival foi mais fluida nesse sentido, foi acontecendo diariamente e isso alterou o próprio festival mesmo que por vezes essa diferença não seja óbvia para o expetador.

Esse espaço permite uma maior ligação ao público, aos vossos expetadores.

É um espaço onde as pessoas podem estar, tem uma videoteca, podem ver filmes, fizemos workshops neste último ano e podem ir conversar conosco. É um espaço aberto a todos, sem exceção. Trata-se de um festival da cidade de Lisboa e agora estamos no centro da cidade.

Dos vários filmes que vão ser exibidos, para onde recaem as tuas escolhas?

É sempre complicado destacar, há alguns filmes que foram para mim uma surpresa, por exemplo, o Joshua Tree 1951: A Portrait of James Dean, um filme que se debruça sobre a sexualidade do James Dean mas faz a abordagem de uma forma muito interessante, sem tabus, muito despretensioso. É filmado a preto e branco e do ponto de vista estético é bastante arrojado.

Outros destaques nesta edição?

O “Keep The Lights On”, de Ira Sachs, é um dos meus favoritos este ano, é uma história muito simples. Conta a história de uma relação que acompanhamos durante uma década, uma relação ensombrada pelas drogas. Outra das grandes surpresas do festival vai ser o documentário da Marina Abramovic, não é uma escolha óbvia, não é diretamente um filme de temática queer mas aborda as questões das relações, as questões de género, da sexualidade no trabalho da artista desde os anos sessenta, setenta, o que acho muito pertinente.

Outra estreia muito aguardada entre nós é do filme “Beauty”.

O Beauty estreou no Festival de Cannes e venceu a Queer Palm na edição do ano passado. Tem uma particularidade social, uma realidade que não é vista muitas vezes, não é abordada no cinema que é a realidade sul-africana. É verdade que caiu o apartheid mas continuam a subsistir grandes diferenças sociais naquele país. Este filme mostra uma comunidade branca rural, é uma comunidade muito fechada e tem um funcionamento próprio, o factor mais relevante é a extrema complexidade dessa micro-comunidade. É sobretudo uma história de desejo de um homem mais velho por um rapaz mais novo.

Qual é o mote, o tema condutor nesta edição?

Não há, este ano de facto não há um verdadeiro mote. Desde há uns anos para cá não estamos preocupados em arranjar um tema. É verdade que no início teve sempre um tema, o ano passado, por exemplo, surgiu o tema da Transgressão para o 15ºfestival. Este ano deixámo-nos levar um bocadinho pela programação. Houve muita produção queer no último ano e meio, dois anos e não encontrámos um fio condutor, se o fizéssemos seria algo bastante vago e não fazia sentido. É das programações mais ecléticas dos últimos anos.

Mas têm um slogan que é “Morte aos clichés gay”.

É um slogan publicitário, não é algo que colemos especificamente a esta edição do festival. Desde o início que combatemos o cliché. O cinema queer surge para combater os clichés, em grande parte fabricados pela indústria de Hollywood. Mas a política mudou também a esse nível.

De que forma é que o Queer Lisboa pode ajudar o cinema português?

Através da função que qualquer festival deve ter que é a de mostrar os filmes, mostrar o que está a ser feito pelos vários realizadores e tentarmos sempre promover esses filmes junto dos nossos colegas programadores nos festivais internacionais. Este ano criámos o Prémio Pixel Bunker para a melhor curta-metragem portuguesa. Dentro da competição das curtas, os filmes portugueses que são sete, estão elegíveis para este prémio. Quem ganhar tem um prémio de 5000 euros em pós-produção. Ao realizarem um próximo filme têm a garantia de que vão ter a pós-produção rapidamente e sem custos para eles.

Passando para o nosso país irmão, o Brasil, qual o motivo para lhe dedicar uma atenção especial?

Esta ideia surgiu de duas coisas, primeiro a vontade de convidar o Diretor do MixBrasil, o João Federici, como júri este ano para o festival e depois aproveitar também asua vinda. Além deste houve outro fator que foi o facto de estarmos a celebrar o Ano do Brasil em Portugal e o Ano de Portugal no Brasil. Posso adiantar que o festival MixBrasil vai ter uma mostra especial de cinema português em Novembro. O João Federici fez um programa de curtas vencedoras no Mix Brasil estes últimos anos e reparámos que pelo menos dois desses filmes ganharam cá em Lisboa o prémio do público. Já sabíamos e agora comprovámos que há uma apetência dos nossos expetadores pelocinema brasileiro e então vamos aproveitar e trazer algumas longas-metragens para construir a secção Queer Brasil.

Em relação às festas e atividades extra-festival quais gostarias de destacar?

Além da Screening&Party já este sábado no Teatro do Bairro com a apresentação em estreia da obra “O Rei dos Gnomos” de João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira, outra festa que destacaria pela originalidade vai ser na sexta-feira, dia 28, a Dry Partyna Trombeta Bath. Esta sauna abriu as portas ao festival. Vai estar aberta a homens e mulheres vestidos. Há muitas que já estão com essa grande expetativa. Vai ter um Dj que é o António Almada Guerra e projeção de filmes. A particularidade é que estamos numa sauna e pode-se usar todo o espaço por isso recomendamos levarem os fatos de banho para usufruírem ao máximo.

Este ano é retomada a legendagem em português na quase totalidade dos filmes, é uma aposta para manter?

A legendagem é uma vontade que temos há muito tempo de retomar e é uma prioridade absoluta. A Sala 1 do Cinema S. Jorge vai estar toda legendada, vai estar a competição das longas-metragens e a maior parte das curtas. Vamos tentar para o próximo ano ter também na Sala 3.

Para finalizar, gostava que lançasses um repto ao público para virem assistir a esta edição do festival.

Convido todos a assistir ao Queer Lisboa 16 porque é um festival de cinema queer mas não é feito especificamente para a comunidade GLBT, é um festival de cinema para toda a gente, onde há filmes para todos os géneros, documentários, fição, comédias românticas, dramas e road-movies.

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