Le Entrevista a Pedro Chagas Freitas por João Freire


Boa tarde. Fala-me um pouco do teu percurso e da tua evolução enquanto escritor. Não enquanto profissional, mas o que te levou a fazer o que fazer agora enquanto ser social.

O meu percurso enquanto escritor confunde-se com o meu percurso enquanto pessoa. Escrever, segundo a minha filosofia, é pensar. Desde que me lembro de ser pessoa que sou escrevente. E fui crescendo em paralelo – enquanto escritor e enquanto pessoa. Escrevo porque é, até ao momento, aquilo que vejo que sou capaz de fazer melhor. Escrever e ajudar a melhorar a escrita dos outros preenche-me bastante – embora comece, cada vez mais, a abrir novas áreas de trabalho, como a de orador, por exemplo. Mas bem vistas as coisas não há grandes diferenças entre um e outro. No fundo, o orador faz aquilo que o escritor faz: obriga quem está do outro lado a pensar. E é isso que eu adoro fazer. Pensar é um prazer do caraças.



Escrita criativa. Explica-me um pouco o conceito por detrás da ideia.


Sob o meu ponto de vista, a escrita criativa sustenta-se em duas premissas fundamentais: técnica exemplar + alma singular. A minha metodologia é, por isso, muito clara: primeiro ofereço as ferramentas para que todos os meus alunos sejam grandes escreventes; depois, sim, podemos passar (ou ir à procura, pelo menos) para o patamar do escritor. O que eu garanto, e garanto mesmo, é que quem faz os meus cursos sai de lá grande escrevente; isto é: alguém com toda a capacidade de escrever e  de transmitir mensagens de forma irrepreensível e exemplar. Não garanto, penso que ninguém pode garantir, que saiam de lá grandes escritores – embora, ultimamente, tenham sido bastantes os que saíram dos meus cursos directamente para a publicação de obras. Mas não é esse o meu principal objetivo.

Quero, e asseguro que é isso que acontece, que todos os que saem dos meus cursos sejam grandes escreventes. E mais ainda: mais capazes de pensar. É, aliás, algo que ouço amiúde no final dos cursos: “agora penso melhor”. Não me dizem apenas “agora escrevo melhor”; dizem “agora penso melhor”. E esta é a prova inequívoca de que escrever é, de facto, pensar. Penso eu.

Consideras que cada vez mais se escreve e fala pior? Que a forma está de tal forma atropelada pelo conteúdo que se torna quase irrelevante?

Não tenho essa noção. De todo. Visito muitas escolas e são bastantes as vezes em que fico agradavelmente surpreendido com a qualidade, a esse nível, que encontro. O que é indiscutível é que 80 ou 90% dos escreventes não fazem a mínima ideia do que é o sistema de pontuação – e colocam as vírgulas e os outros sinais quase à sorte. É por isso que os meus cursos se ocupam disso até à demência – sempre de forma lúdica, prática e sem secas nenhumas. Não uso uma única denominação gramatical clássica. E é assegurado que quem frequenta as minhas ações jamais voltará a falhar a esse nível – ao nível da pontuação. Há quem diga que isso é espantoso – eu digo apenas que é lógica. Entendendo o processo, pontuar um texto é mais simples do que respirar.

Usas as redes sociais de forma hábil e precisa. Achas essa uma forma eficaz de chegar às pessoas?

As redes sociais, como a própria denominação indica, são redes que juntam pessoas – logo: é natural que cheguem às pessoas. No meu caso pessoal, tenho, espalhadas pelas várias páginas, mais de 20 mil leitores que me seguem diariamente. É tremendo. E é, claro, um orgulho imenso. Não tenho dúvidas algumas em afirmar que, por essa via, sou um dos autores portugueses mais lidos em Portugal.

Queres comentar o novo acordo ortográfico? Modificaste a tua escrita para o cumprir?

Sou o número 66 da petição contra o acordo. Sou contra, não o sigo e acredito que pode haver um volte-face. Torço por isso.

Achas que o ensino da Língua Portuguesa se encontra desajustado? Que explicação encontras para um tamanho afastamento da população, principalmente a mais nova, da pureza e riqueza da nossa língua?

Acredito, sim. E é isso que eu tento desmistificar nas minhas sessões com os mais novos – e até com os mais velhos. Nas minhas sessões, como referi anteriormente, não há denominações complexas nem temáticas secantes. A gramática é um sistema lógico e deve entendido enquanto tal. Só para terem uma ideia: nas minhas sessões uso legos, copos de vidro, copos de plástico, jogos de cartas, setas e muitas mais coisas impensáveis para o ensino tradicional. É urgente que se desconstrua essa forma de ensinar. Só assim o ensino poderá ensinar para dentro – e não, como acontece agora, para fora – da criatividade. É a criatividade que faz, nos dias de hoje, a diferença. É fundamental que o sistema valorize isso. A criatividade é tão ou mais importante que a matemática ou o português. Esse desajuste deve ser corrigido. O melhor aluno não pode continuar a ser o aluno que erra menos – porque na vida o profissional mais competente não é o que erra menos; é o que soluciona mais. E solucionar é, muitas vezes, inventar, criar, fazer diferente – mesmo correndo o risco, evidentemente, de errar. Quem tem medo de errar jamais fará a diferença. E o ensino, atualmente, premeia quem não faz a diferença. Fazer sempre a mesma coisa é o princípio da morte de qualquer país.

As palavras que usas são pensadas e manipuladas posteriormente à sua escrita, ou é tudo espontâneo?

A minha máxima, nesse ponto, é clara: escrever como um poeta, rever como um cientista. E é assim mesmo que atuo: escrevo a mil à hora, sem rede; e depois revejo de lupa numa mão e bisturi na outra. Rever e editar um texto consistem em olhar para a gordura e fazer uma lipoaspiração severa. Se está algo no texto – seja palavra ou sinal de pontuação – que não é decisivo, que não traz mais-valia inequívoca: então cai. Tem de cair. Sem misericórdia. Por mais que tenha custado a sair: cai. O segredo para a grande obra é ser o mais pequena possível.

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Enlaces

www.pedrochagasfreitas.com

www.escritacriativa.org

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